Os vampiros de Brogodó - Episódio II
Brogodó respirava política todos os dias
do ano, mas quando chegava no ano eleitoral, a coisa pegava fogo literalmente. Os
eleitores agiam de forma passional e defendiam com unhas e dentes seus
políticos. Se envolviam com tamanha paixão que, as vezes dava até morte. Velhos
amigos viravam inimigos; familiares brigavam entre si; casais se separavam.
Tudo fazia parte de um jogo envolvente dos vampiros para que aquele povo se
sentisse parte do jogo. No fundo, quase todos eram manipulados e estavam no
mesmo saco defendendo os interesses dos vampiros contra os seus próprios.
A cada eleição, os vampiros promoviam
dantescos espetáculos e transformavam a disputa num picadeiro, usando e
abusando da política pão e circo. O povo se divertia e, muitos aproveitavam
para ganhar um dinheirinho ou até mesmo objetos como: óculos, tijolos, telhas,
sacas de cimento, cesta básica, dentaduras, etc. Muitos desempregados ou
desocupados aguardavam esse momento para conquistar o trabalho dos sonhos que
era balançar bandeira nos cruzamentos e acompanhar os políticos nas passeatas e
comícios. A ordem era aplaudir e gritar palavras de ordem, independente do que
o político falasse. Bastava o sujeito subir no palanque e dizer “boa noite
brogodoenses”, já se ouvia gritos histéricos e palavras desconexas como “lindoooo!”
“Maravilhosooo!” “Te amooo!”.
Uma minoria quase insignificante lutava
bravamente para mudar aquela situação. Esse grupo era composto majoritariamente
por trabalhadores rurais, operários das minas de diamante e alguns intelectuais
como, advogados, administradores, engenheiros, padres, e, muitos, muitos
professores. Pregavam uma Brogodó para todos com justiça, paz e equidade. Denunciavam
a corrupção, as tramoias políticas e os acordos nefastos entre executivo e
legislativo. Faziam muitas reuniões e construíam planos para retirar Brogodó
das garras dos vampiros. No início, falavam quase que exclusivamente para eles
próprios e quase ninguém os levava a sério. Aos poucos, a plateia foi
crescendo, mesmo que por curiosidade. Alguns falavam: “vamos lá ouvir o
que aqueles malucos estão falando”.
Esse grupo de opositores foi crescendo,
crescendo, ocupando vários espaços até que ficou grande. Se antes as pessoas
ouviam com descrédito e desdém, agora já tinha um numero significativo de
pessoas que aderiam às ideias e tomavam consciência de que poderiam se unir e
derrotar os vampiros. Aquela ideia de que a família vampiresca dos Salins era
imbatível, ia perdendo força e, no fundo do túnel começava a aparecer uma luz
verde.
E aconteceu o que muitos duvidavam. O
ano era 1940 do ano de Nosso Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus. Ano eleitoral
onde os vampiros esperavam confiantes por mais uma eleição “normal” como era de
costume. Um velho vampiro, chefe do clã dos Salins que há muito dominava
Brogodó sucederia sua mulher que já estava há dois mandatos no poder enquanto
seu marido se aventurava por outras bandas. Tudo parecia normal.
Normal, mas nem tanto. Na eleição para
escolha do governador da Pensilvânia que ocorrera há dois anos, os vampiros de
Brogodó tomaram o maior susto. Uma mulher quase desconhecida, candidata ao
governo pela oposição, deu uma surra no candidato dos vampiros e, só não se
elegeu porque sua votação expressiva só se deu em Brogodó. Esse foi um aviso
que fez com que a vampirada reforçasse sua defesa e atacasse ainda mais aquele
grupo de oposição considerado até então inofensivo.
Pois muito bem. Voltemos a eleição de
1940. A campanha começou fria até que foi esquentando. A oposição aos vampiros
foi tomando corpo e, sem dinheiro, sem estrutura, foi se espalhando como rastro
de pólvora. De repente, a cidade inteira foi invadida pela cor lilás que
representava a cor do grupo de oposição batizado de BROGODÓ PARA TODOS.
A cada comício, a cada passeata, cada carreata, era surpreendente ver como
aquele grupo crescia. Foi a campanha mais bonita e apaixonante que Brogodó já
vira até então. Muitos até falavam empolgados que aquela era a campanha mais
bonita de toda a Pensilvânia ou, quiçá do país.
A campanha contra os vampiros de Brogodó
seguia firme e mais empolgante a cada dia. O candidato representante da
oposição foi escolhido pela sua simplicidade, sua simpatia, mas, principalmente
devido ao seu carisma de se comunicar com o povão. Dizem as más línguas que ele
não tinha a menor ideia do que fosse administração nem governo, e, além de tudo
era desorganizado e desleixado até com sua vida pessoal. Mas, seu talento de se
comunicar com o povo dava gosto de ver. Era daqueles que saia de casa de manhã
para comprar pão para o café e voltava a noite sem os pães, mas cheio de histórias
sobre as conversas que tivera com as pessoas na rua. “Eis aí o nosso
candidato ideal. No quesito administração, nós daremos um jeito. Nós montaremos
uma equipe técnica competente e com habilidade para governar. O Vavá será nosso
passaporte para ganhar as eleições dos vampiros. Vamos furar essa bolha”
– dizia empolgado o professor João Paulo, líder da oposição.
Ia tudo muito bem na campanha mais
empolgante e bonita de toda a história. O candidato Vavá, a cada dia empolgava
mais os eleitores. No início, tinha dificuldade para discursar, mas logo pegou
o jeito e, falava por horas para uma multidão cada vez mais entusiasmada. Mas uma
coisa começou a deixar os líderes da oposição com uma pulga atrás da orelha. É
que apesar do grupo não ter dinheiro e ter que fazer vaquinha até para comprar
água, de repente, começou a aparecer uma fartura de material. A multidão que
lotava os comícios, aparecia em peso de camiseta lilás e portando bandeiras.
Quem comprou? Quem pagou? Ninguém sabia. O Vavá dizia que o povo estava comprando
com o próprio dinheiro. Do nada, aparecia um cantor famoso para animar o
showmício. Quem contratou? O diretor do comitê não sabia. No palco, a
coordenação do evento muitas vezes percebia rostos estranhos àquela campanha. “Quem
é esse com cara de barão? Não conheço”. “Quem é esse do chapelão com pinta de
latifundiário? Nunca vi mais gordo”. “E essa madame com jeito esnobe, seria uma
espiã? Não conheço, mas a bicha é bonita! Deixa ela aí. Pelo menos enfeita
nossa campanha”. E o Vavá, sempre muito simpático, muito solícito, ia
agregando a todos. No final da campanha, havia mais gente estranha
acompanhando-o do que seus próprios amigos e companheiros de partido. Mas, o
mistério continuava. Ninguém sabia de onde vinha tanto dinheiro, tanto material
e tantas atrações caras. Mas naquela altura do campeonato, era bom nem
perguntar. Todos estavam empolgados demais para se preocupar com detalhes sem
importância.
Eis que chegou o dia da eleição. Mesmo
com os ataques violentos dos vampiros, o grupo de oposição deu uma lavada e
venceu com folga. Mesmo já completando vinte anos, lembro-me como se fosse hoje a explosão de alegria e o clima
de empolgação e esperança que tomou conta de Brogodó. Era festa pra todo lado.
Até alguns fazendeiros que antes se declaravam inimigos daquele “bando de
baderneiros comunistas” – como costumavam se referir ao grupo do Vavá – doaram
vacas para o churrasco. Empresários empolgados comemoravam e se diziam ser Vavá
desde criancinha. Foi uma vitória para lavar a alma daquele povo sofrido que
resolveu, como num passe de mágica, abrir os olhos e se livrar de uma vez por
todas dos vampiros.
Será?
Segue no episódio III
Kkkkkkkkk
ResponderExcluirKkkkkk, eita Brogodó
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