Texto indicado pelo leitor José O. (Zelão) Vieira Reis
Diz a lenda que
Assis Chateaubriand, magnata da imprensa entre os anos 1940 e 1960, costumava
responder aos pedidos de aumento salarial de seus empregados com uma pergunta
retórica: “Mas você não é repórter? Precisa de dinheiro pra quê?”
Era no tempo do rei
- ou quase isso. Na concepção do dono dos Diários Associados, o salário de um
jornalista era um detalhe entre outros rendimentos indiretos provenientes do
ofício.
Em outras palavras,
o repórter não precisava ter dinheiro para ter acesso a restaurantes, festas,
presentes: bastava se relacionar com as pessoas certas - as interessadas em
manter um bom relacionamento com quem poderia escrever sobre elas.
Desde que comecei a
trabalhar como jornalista já recebi ofertas de viagem, convites para shows,
jantares, ingresso para assistir corrida de automóveis e até de passeio de
helicóptero. Aceitar seria divertido, mas significaria colocar sob suspeita
qualquer notícia relacionada à generosidade das empresas.
Fico imaginando a
vida de quem, em vez de espaços na imprensa, tem a prerrogativa de propor
projetos de lei. Ou de sancioná-los.
No exercício do
poder, políticos costumam dizer que, ao fim do mandato, é estranho acostumar-se
novamente a abrir (literalmente) as próprias portas. Por extensão, deve ser
estranho voltar a abrir a carteira após anos circulando entre agrados de
anfitriões e convidados – há sempre, imaginamos, alguém disposto a acertar a
fatura. Digamos, a reforma de um sítio. Ou um apartamento. Ou a pensão dos
filhos.
Na estranha
história da reforma de um sítio frequentado pela família Lula, paga
supostamente por empreiteiras investigadas na Lava Jato, não é o valor da obra
ou das encomendas entregues no local os elementos de suspeição. É o fato de um
ex-presidente, influente no governo da sucessora e com razoáveis pretensões
eleitorais, ter supostamente aceitado o agrado de empresários interessados em
manter o bom relacionamento institucional em troca de favores pessoais.
Não importa o
quanto esses agrados pareçam picuinhas. Quando se trata de figuras públicas,
tenham ou não mandato é justificada a atenção da imprensa e das autoridades
sobre a proximidade entre eles e as empresas interessadas em operar por meio de
agrados ou atalhos.
Tão estranho quanta
essa proximidade para além da margem de segurança é usar simpatias e antipatias
partidárias para espernear ou cravar quem (não) inventou a roda. Em uma disputa
tão acirrada entre partidos, é bom lembrar os versos de uma velha música: “tudo
aquilo contra o que sempre lutam é exatamente tudo aquilo que eles são”.
Confortável, até
então, no camarote de onde assistia à dissolução do patrimônio petista - o
discurso de que, apesar dos erros e das prisões de aliados, tudo foi feito em
nome de um bem maior, jamais em troca de benefícios pessoais - Fernando
Henrique Cardoso será cobrado, a partir de agora, a explicar por que diabos uma
empresa privada repassaria, durante anos, recursos para a conta de Mirian
Dutra, ex-amante de quem reconheceu o filho, no exterior.
FHC, que até ontem
subia no pedestal para pedir a renúncia de adversários, jura que os recursos
eram dele. A transferência era feita, segundo noticiou a colunista Mônica
Bergamo, por meio da assinatura de um contrato fictício de trabalho entre
dezembro de 2002 e dezembro de 2006. O acordo, afirmou a jornalista, foi
intermediado por um lobista.
À Folha o
ex-presidente admitiu manter contas no exterior e ter mandado dinheiro para o
filho da jornalista, que foi presenteado recentemente com um apartamento de €
200 mil em Barcelona, na Espanha.
O que faz da vida dele,
por óbvio, é questão de foro íntimo. Mas, se pau que bate em Chico também bate
em Francisco, as perguntas de sempre, válidas para qualquer homem público,
sobre correlação entre despesas, patrimônio e favores desempenhados por
terceiros podem e devem ser feitas. Em situação parecida, o senador Renan
Calheiros (PMDB-AL) foi alvo de uma devassa por tentar justificar a origem de
recursos para pagar a pensão de uma amante – a suspeita é que o acerto era
cortesia de uma empreiteira.
O chato disso tudo é que a Globo, quando cita o caso, Santifica o FHC e condena a Mirian Dutra, como se ela fosse a vilã e ele o mocinho. E olhem que a moça era uma global de nível internacional! Já pensou se fosse uma pé de chinelo - uma putinha qualquer? Já estaria na fogueira fazendo companhia a Joana D'arc.
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